Ideias para Debate

Tuesday, May 31, 2005

Pobreza e Riqueza

O texto de Afonso dos Santos provocou a reacção do Sérgio Gomes:

Fiquei atraído pelo texto do Afonso dos Santos por se enquadrar dentro duma perspectiva metodológica que tenho tentado perseguir segundo a qual pra que possamos explicar melhor um fenómeno social temos que procurar perceber o seu oposto (reparo que nem todos os fenómenos criam essa facilidade). Contudo fico um pouco preocupado pelo facto do autor perceber o emprego do discurso sobre o combate a pobreza como sendo desnecessário porque baseado numa construção demagogica dos politicos, particularmente os que estão no poder.

Julgo existirem pelo menos duas formas de olhar para a folklorização do discurso de combate à pobreza absoluta. Uma forma negativa e outra positiva. O Afonso Santos parece-me trilhar pela perspectiva negativa, portanto, de rejeição do próprio discurso. A apreciação negativa do discurso leva-nos a considerá-lo como uma manobra (para não dizer ‘acção concertada’) para divertir a atenção do público em geral sobre a situação de ostentação que somos obrigados a apreciar, principalmente na grande cidade do Maputo. O argumento é que quanto mais a ideia da pobreza de muitos estiver enraizada nas nossas mentes teremos menos tempo pra questionar a natureza da riqueza de poucos. A segunda forma de apreciar o discurso sobre o combate à pobreza, é a abordagem positiva que se pode manifestar de duas maneiras:
1. ele nos desperta pra necessidade de redobrarmos os esforços de modo a melhorarmos, por nossos próprios meios, a nossa condição material ao mesmo tempo que nos deixa com referências (sem as referir) de pessoas que graduaram da situação da pobreza como forma de demonstração da possibilidade de tal graduação.
2 o reconhecimento da legitimidade do discurso que não só trasmite a realidade factual mas tambem sensibiliza, principalmente a comunidade internacional, sobre a situação precária em que os Moçambicanos se encontram, chamando atenção para a necessidade de mais recursos, em forma de doação, serem canalizados ao país.

Como podemos ver qualquer uma das perspectivas de apreciação do discurso sobre o combate a pobreza absoluta tem implicações politicas (de policy e nao politics) distintas podendo levar o apreciador/observador a considerar-se vítima numa sociedade de batota onde uns acomulam cada vez mais e outros são marginalizados ou, por outro lado, podendo levar o apreciador a redobrar os seus esforcos para a melhoria da sua condição e a motivar-se pela existência duma possibilidade de graduação (já que existem casos de graduados).

Contudo, acho que, mais do que a simples apreciação do discurso, a questão do fundo é de procurar saber como fazer com que a riqueza dos poucos que graduaram seja benéfica ou colocada ao servico dos que ainda procuram graduar. A formula mais simples seria, por exemplo, que os mais ricos dessem a nós pobres metade do que eles têm a mais do que nós. Caso a proporção dos ricos em Mocambique fosse igual à proporção dos pobres, então, a aplicação daquela formula traria os Mocambicanos pra os mesmos niveis de riqueza ou de pobreza. Contudo, a realidade é diferente e é um facto que a proporção dos graduados representa não mais do que 10% da população Mocambicana (minha inferência) e que a restante percentagem representa os que duma ou doutra forma se consideram pobres.

A solução não está necessariamente ou somente com o governo ou o Estado. De facto, o Estado pode adoptar uma política fiscal pro pobres ( e me parece que é isso que está a ser feito) mas dado o reduzido número dos graduatos o efeito distribuitivo pouco se faz sentir junto dos pobres ainda por graduar. A solução sustentavel, no meu ponto de vista, está com os já graduados, que devem mudar a atitude em relação à sua própria riqueza no sentido de evitar demonstrações baratas que só provocam invejas desnecessárias e assumir um ethos económico que passa necessariamente pela apreciação da sua riqueza como um activo que pode ser mobilizado e colocado ao servico da economia pra criar mais riqueza duma forma socialmente responsavel.

“What About”
Misr

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