Será censura?
Recebi do Zé Teixeira o seguinte texto em que contesta algumas opiniões aqui colocadas sobre o post Uma Voz Divergente:
Caro Machado
Decidi mesmo escrever, se quiseres coloca, se não quiseres claro que compreendo.
DO MÉTODO DE CONVERSAR
Escrevo-te, a medo, e pelo texto seguinte compreenderás o receio que este vulgar mortal adquiriu em participar no teu blog. Faço-o por causa da reacção ao "Uma Voz Divergente", esse texto discordante do tom do Ideias Para Debate, o qual culmina num: "O mundo está super-prenha de palavras de pseudo-intelectuais e intelectuais! Acção amigos...acção!".Não concordo com as ideias que ali são expressas. E apreciei, no global, os argumentos sociológicos na resposta do Patrício Langa.
Tal como estou a apreciar, e na expectativa, os textos de Elísio Macamo, que me eram desconhecidos e cuja apresentação aqui PL então provocou. Portanto não é ao nível da concordância ou discordância com a essência dos argumentos que aqui venho.O que me surpreende é a reacção, o seu conteúdo. Sérgio Cruz, a voz discordante, opinou, provocou. A reacção não foi negar-lhe as ideias e a argumentação. Foi, acima de tudo, declará-lo incompetente para o debate. E logo de seguida apresenta-se, e sustentado no peso simbólico de um grande académico, o modo correcto de debater (talvez até transformado em princípios editoriais do blog), esse modo do qual o discordante opinador surge deficitário, é claro.
Assim sendo, e pelo que PL escreveu e pelo que vou lendo de EM, e me atrevo a prever, há um modo correcto de argumentar - o qual se espera vir a ser o modo de fazer (repara que sem latim) este blog: é o de res-pei-to-sa-men-te-a-pre-sen-tar-a-cor-rec-ta-ar-gu-men-ta-ção. E, subentende-se, numa linguagem dita neutral, aparentemente clara, reclamada como sem múltiplos significados.
(Auto)Censória esta linguagem? Permite-me o quase-parêntesis para me fazer entender: é-me permitido dizer "manipular conceitos", "olhar a realidade", "amar a verdade", "articular perspectivas", "fazer recuar oponentes", "escrito a correr", "falar sem pensar", etc. Tudo metáforas fisiológicas reclamando ou negando objectividade e eficiência na análise. Mas Langa censura "ejacular", outra metáfora fisiológica, prenhe de significados (rapidez, inutilidade, auto-complacência, etc). Sei, por experiência, que o português de Moçambique é mais casto do que o meu. Mas com "ejacular" nem sequer estamos no domínio do vernáculo (e sobre a minha defesa da utilização não-profissional do vernáculo já terás lido). Estamos sim na delimitação das metáforas aceitáveis, estamos no domínio do disciplinar o uso da língua, do simbólico, dos sentidos aceitáveis no diálogo interpretativo.
Para quem está no senso comum (a norma da "boa-educação" desligada da sua conjuntura classista, temporal, local) tudo bem, para quem está no registo sociológico (ainda que in-blog) isto é a mera reprodução de uma disciplina que se espera não lhe ser invisível.(Auto)Censório aquele método? Permite-me o não parêntesis. Tenho assistido a inúmeros debates e em muitos e diferentes contextos, geográficos, sociais, linguísticos, profissionais. Em todos , em todos há formas compósitas de argumentação: silêncios, provocações, expressões faciais e corporais, onamatopeias (e até apupos), demonstrações colectivas, quantas vezes insultos, humor, amuos, complicações e hesitações, ironia, eu sei lá.
E, sem reclamações "culturais", lembro alguns diálogos platónicos ditos fundadores onde a argumentação não explanativa é dita irónica mas só o respeito escolástico não a afirma sarcástica (mero ex. Protágoras) . Ou seja, o tipo-ideal do processo argumentativo não é esse, mas a(s) realidade(s) torna(m-se) essa(s). E é com isso que devemos (ou temos que) coabitar, em quadros mais ou menos fluídos de interpretação.
Não quero negar a pertinência e a excelência da pedagogia da argumentação que aqui Langa encetou e Macamo desenvolve(u). Nem a sua utilidade. Também não estou aqui para ser do contra. Mas arrepio-me com alguns dos seus efeitos. Neste caso o do enquadrar, disciplinar (mais uma palavra nada neutral) do Ideias Para Debate. O qual, se me permites, não lhe potenciará a capacidade de debate (como algum senso comum aceitará diante do "capital simbólico" dos académicos), a capacidade analítica.
Em meu entender provoca mesmo o efeito da ininterpretação.Foi proclamada a incompetência do texto "Uma Voz Divergente", "deitou-se para o lixo" (será metáfora aceitável?). Mas nele está tudo o que é necessário. Uma hierarquia de valores e de objectivos. A qual surge indiscutida porque indiscutível, portanto naturalizada. Está ainda uma desvalorização de actividade intelectual (a qual surge, quase explicitamente, como a ligada ao que antes se chamava "humanidades"), e desse modo postulada uma hierarquia de saberes. Está um método político, um primado da acção. De forma grosseira posso até sintetizar.
Num pequeno e nada cuidado texto Sérgio Cruz apresentou uma "filosofia", ali disponível para ser interpretada, criticada e, até, rebatida. Quantas páginas (e num blog, ainda para mais, terra de textos curtos) precisariam tantos (de nós) para condensar tanta argumentação? Interpretável.Incompetência? Como? se estão lá todos os argumentos para um debate. Preconceituoso? Claro, mas em quê e com efeitos?
Pois, meu caro Machado, o que é realmente fundamental, o que me arrepia, é que aquilo que Sérgio Cruz sintetizou, aquilo que "foi para o lixo", chama-se tecnocracia. Ali "deselegante", noutros tantos sítios "Projecto/Programa". E esta tecnocracia é não incompetente mas sim o pensamento dominante. Reduzir esta amostra que te entra blog dentro a incompetência e preconceito porque não segue as regras certas da conversação (e da etiqueta?) é um assustador sinal.
De quê, meu caro? Em meu entender, sinal de mera tecnocracia. Ininterpretativa.
Abraço para ti e para os participantes deste Debate tão bem-vindo.
Caro Machado
Decidi mesmo escrever, se quiseres coloca, se não quiseres claro que compreendo.
DO MÉTODO DE CONVERSAR
Escrevo-te, a medo, e pelo texto seguinte compreenderás o receio que este vulgar mortal adquiriu em participar no teu blog. Faço-o por causa da reacção ao "Uma Voz Divergente", esse texto discordante do tom do Ideias Para Debate, o qual culmina num: "O mundo está super-prenha de palavras de pseudo-intelectuais e intelectuais! Acção amigos...acção!".Não concordo com as ideias que ali são expressas. E apreciei, no global, os argumentos sociológicos na resposta do Patrício Langa.
Tal como estou a apreciar, e na expectativa, os textos de Elísio Macamo, que me eram desconhecidos e cuja apresentação aqui PL então provocou. Portanto não é ao nível da concordância ou discordância com a essência dos argumentos que aqui venho.O que me surpreende é a reacção, o seu conteúdo. Sérgio Cruz, a voz discordante, opinou, provocou. A reacção não foi negar-lhe as ideias e a argumentação. Foi, acima de tudo, declará-lo incompetente para o debate. E logo de seguida apresenta-se, e sustentado no peso simbólico de um grande académico, o modo correcto de debater (talvez até transformado em princípios editoriais do blog), esse modo do qual o discordante opinador surge deficitário, é claro.
Assim sendo, e pelo que PL escreveu e pelo que vou lendo de EM, e me atrevo a prever, há um modo correcto de argumentar - o qual se espera vir a ser o modo de fazer (repara que sem latim) este blog: é o de res-pei-to-sa-men-te-a-pre-sen-tar-a-cor-rec-ta-ar-gu-men-ta-ção. E, subentende-se, numa linguagem dita neutral, aparentemente clara, reclamada como sem múltiplos significados.
(Auto)Censória esta linguagem? Permite-me o quase-parêntesis para me fazer entender: é-me permitido dizer "manipular conceitos", "olhar a realidade", "amar a verdade", "articular perspectivas", "fazer recuar oponentes", "escrito a correr", "falar sem pensar", etc. Tudo metáforas fisiológicas reclamando ou negando objectividade e eficiência na análise. Mas Langa censura "ejacular", outra metáfora fisiológica, prenhe de significados (rapidez, inutilidade, auto-complacência, etc). Sei, por experiência, que o português de Moçambique é mais casto do que o meu. Mas com "ejacular" nem sequer estamos no domínio do vernáculo (e sobre a minha defesa da utilização não-profissional do vernáculo já terás lido). Estamos sim na delimitação das metáforas aceitáveis, estamos no domínio do disciplinar o uso da língua, do simbólico, dos sentidos aceitáveis no diálogo interpretativo.
Para quem está no senso comum (a norma da "boa-educação" desligada da sua conjuntura classista, temporal, local) tudo bem, para quem está no registo sociológico (ainda que in-blog) isto é a mera reprodução de uma disciplina que se espera não lhe ser invisível.(Auto)Censório aquele método? Permite-me o não parêntesis. Tenho assistido a inúmeros debates e em muitos e diferentes contextos, geográficos, sociais, linguísticos, profissionais. Em todos , em todos há formas compósitas de argumentação: silêncios, provocações, expressões faciais e corporais, onamatopeias (e até apupos), demonstrações colectivas, quantas vezes insultos, humor, amuos, complicações e hesitações, ironia, eu sei lá.
E, sem reclamações "culturais", lembro alguns diálogos platónicos ditos fundadores onde a argumentação não explanativa é dita irónica mas só o respeito escolástico não a afirma sarcástica (mero ex. Protágoras) . Ou seja, o tipo-ideal do processo argumentativo não é esse, mas a(s) realidade(s) torna(m-se) essa(s). E é com isso que devemos (ou temos que) coabitar, em quadros mais ou menos fluídos de interpretação.
Não quero negar a pertinência e a excelência da pedagogia da argumentação que aqui Langa encetou e Macamo desenvolve(u). Nem a sua utilidade. Também não estou aqui para ser do contra. Mas arrepio-me com alguns dos seus efeitos. Neste caso o do enquadrar, disciplinar (mais uma palavra nada neutral) do Ideias Para Debate. O qual, se me permites, não lhe potenciará a capacidade de debate (como algum senso comum aceitará diante do "capital simbólico" dos académicos), a capacidade analítica.
Em meu entender provoca mesmo o efeito da ininterpretação.Foi proclamada a incompetência do texto "Uma Voz Divergente", "deitou-se para o lixo" (será metáfora aceitável?). Mas nele está tudo o que é necessário. Uma hierarquia de valores e de objectivos. A qual surge indiscutida porque indiscutível, portanto naturalizada. Está ainda uma desvalorização de actividade intelectual (a qual surge, quase explicitamente, como a ligada ao que antes se chamava "humanidades"), e desse modo postulada uma hierarquia de saberes. Está um método político, um primado da acção. De forma grosseira posso até sintetizar.
Num pequeno e nada cuidado texto Sérgio Cruz apresentou uma "filosofia", ali disponível para ser interpretada, criticada e, até, rebatida. Quantas páginas (e num blog, ainda para mais, terra de textos curtos) precisariam tantos (de nós) para condensar tanta argumentação? Interpretável.Incompetência? Como? se estão lá todos os argumentos para um debate. Preconceituoso? Claro, mas em quê e com efeitos?
Pois, meu caro Machado, o que é realmente fundamental, o que me arrepia, é que aquilo que Sérgio Cruz sintetizou, aquilo que "foi para o lixo", chama-se tecnocracia. Ali "deselegante", noutros tantos sítios "Projecto/Programa". E esta tecnocracia é não incompetente mas sim o pensamento dominante. Reduzir esta amostra que te entra blog dentro a incompetência e preconceito porque não segue as regras certas da conversação (e da etiqueta?) é um assustador sinal.
De quê, meu caro? Em meu entender, sinal de mera tecnocracia. Ininterpretativa.
Abraço para ti e para os participantes deste Debate tão bem-vindo.
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