Ideias para Debate

Sunday, April 17, 2005

Perspectiva económica

Entra agora no debate o Nelson Maximiano, que nos tras a sua perspectiva. Estuda também no Cabo. Economia. Vejamos o que tem para nos dizer:


Caro Machado da Graça

Permita-me em primeiro lugar dar-lhe os meus parabéns pela ideia e materialização da construção de um espaço onde nos possamos encontar para discutir "ideas para debate".Vários textos foram chegando até mim através de amigos, todos em volta de assuntos profundamente ligados ao seu canal de debate. Amigos estes jovens, mas jovens não porque não tenha amigos menos jovens (em idade),mas sim porque se "irradia" no seu blog a chama de ideias que nos fazem(aos jovens) queimar mais pestanas do que o normal. Em segundo, apresentar-me dizendo que sou jovem, tb da geração"samorista" (vinte e poucos anos) e me tenho juntado àqueles que pensam e fazem do seu pensar uma mais valia para a resolução dos problemas que agudizam meu pais. Ok! Lá vai, sou um estudioso do social, no seu sentido mais quantitativo, Economia.

O CHULÉ DO SAPATO OU CHEIRO DO CHULÉ?

"Muitas das razões para se acreditar numa natureza humana clara e coerente, estão em dúvida e sob fogo." (Youg: 1995)

Partilho de muitas das posições tomadas pelos meus amigos Langa e Paulo, acresce porém que as sinto incompletas sob ponto de não totalizarem as ideias que tenho para este debate. Pela extensão que o mesmo tomou,corro o risco de ter perdido o comboio, deixem-me no entanto correr ao seu encontro!
Do fruto se julga a árvore, foi a primeira ideia que me veio à mente como resposta aos argumentos que vi apresentados. Mas o processo pensante obrigou-me porém a abordar o assunto com um pouco mais de profundidade. Segundo Rorty, Richard (1980) a verdade é feita mas nunca encontrada, já Douglas, Mary (1975) defende que a sujidade é uma questão sem lugar definido. O que quererá isto dizer? Que não há culpados? Pelo contrário, quer isto apenas dizer que mais fundo do que à primeira vemos se encontra a solução ou causa para o que identificamos como problema. Mas nestas coisas de jovens e adultos numa coisa concordo com o Mia Couto: poucos há que falam com os jovens! É que se calhar tivesse o Mia discutido o assunto com um grupo de jovens e quiçá o seu discurso seria virado para Os sapatos do setimo chulé e não para o chulé do setimo sapato! É que no meu ponto de vista o problema não é o chulé do sapato mas sim o cheiro do chulé. É que porventura não terão todas a sociedades e civilizações tido chulé nos seus sapatos? Mesmo que estes fossem novos e fabricados à medida não haveria sempre um rastilho de chulé? O problema não é chulé em si, mas sim o cheiro do chulé. Neste caso não será o sapato apenas um objecto "vítima" da sujidade que se albergou sobre si? Se descalçarmos os sapatos e comprarmos (ou será que já temos capacidade criada para os fazermos?) sapatos novos e à medida, não ficará algum chulé no pé? E será que temos dinheiro (ou capacidade instalada) para comprar (ou fazer) sapatos novos? E será que temos conhecimento (da verdade) o suficiente para sabermos qual a exacta medida do sapato que precisamos? Ou vamos fazer como temos feito estes anos todos e experimentar sapatos "doados" ou "emprestados" para depois dizermos que eles têm chulé? Não será em alguns casos este chulé defeito de proviniência (e não de fábrica)? É que a "sujidade" está em todos os objectos usados pelo país Moçambique. Há sempre alguma sujidade á espreita! Então, será que se tentarmos ver com olhos de ver o visível e o menos visível: não será a sujidade o principal problema? Ou não é verdade que é a sujidade que provoca o cheiro do chulé? Difícil se revela encontrar a "verdade feita".Desta forma nos temos de apoiar em modelos da realidade que possamos usar como seu espelho, mas também os modelos são falíveis se os tentarmos tornar mais complexos ou demasiado simples (ou mesmo por outras razoes técnicas que não importa aqui detalhar!!). O meu ponto é que o modelo usado pelo meu caro Mia Couto para análise se me revela demasiado simples para a realidade em questão, a verdade está mais ao fundo! E é esse fundo que tentam e conseguem os meus caros Langa e Rigger percorrer em seus textos. Mas ATENÇÃO: mesmo com defeitos um modelo eh sempre uma aproximação da realidade, um espelho da verdade, que por ser espelho é também verdade se lhe reconhecidas as limitações, procuro no discurso de todos os "agentes de debate" as limitações e não as encontro! Talvez por não as ter sabido identificar ou talvez.... por omissão dos autores.Para mim, o problema eh o cheiro do chulé e não o ter ou não ter chulé no sapato, que a meu ver terá sempre alguma sujidade. Então problema mais problema que o cheiro é a sujidade, e esta não está apenas nos sapatos! Está em todo o lado! Mesmo assim porque sou jovem, e minha jovem inocência me permite sonhar (como dizia um de meus amigos menos jovem!) continuo acreditando ser possivel limpar não só os sapatos mas também...
Procuro agora a ligação entre o que acima escrevi e o texto do Quitério Langa, e a encontro na seguinte questão:Não seremos todos inescapavelmente agentes sociais darwinistas? Ou será que o bendito princípio da "mão invisível" é sempre válido? E mesmo que seja não estará esta mão sempre mais virada para o lado que pratica a acção (seja esta entendida nas diversas formas)?O sujeito "eu" foi, é e será sempre acompanhado por vontades pessoais, a história mostra-nos que por detrás das grandes revoluções esteve sempre o somatório das vontades pessoais dos membros dos tais "grupos revolucionários", e nem sempre a vontade do líder foi a vontade das somas! E se calhar encontramos aqui a resposta (verdade) para muitas das questões que nos colocamos a cerca da nossa história.Mas o argumento das vontades pessoais é por si só bastante relativo. E algumas vezes argumentos como "liberdade", "revolução", "resistência","independência" e até "democracia" são apenas uma justificativa para o desenvolver de acções que mudam o percurso da história. Perdem-se líderes, perdem-se vidas, destroiem-se comunidades, tudo a troco da"soma das vontades". E à volta de tudo isto está um objecto relacionado com cada um dos personagens envolvidos, o qual não tem necessariamente que ser tangível, nem de ter forma exacta. Esse objecto pode ser a felicidade, a promessa de uma vida melhor, de um maior bem-estar e satisfação, etc. Agora este argumento começa a fazer sentido! O objecto formado no inconsciente (que pode a dada altura passar para o consciente) se transforma no guia da condução.É aqui que entra em jogo o poder! Ou será a fome de poder? Porque se o dinheiro para o rico significa poder, o poder para o pobre significa dinheiro! É na busca deste que a "soma das vontades" do grupo revolucionário exerce a sua influência, exercita com saber a exploração das regras existentes ou criadas para sustentar os seus objectivos, para saciar a sua fome. A moral, as leis, a religião, tudo isto são regras que nas mãos de determinados agentes servem de laços de ligação entre oque o sujeito social deve (ou será pode?) fazer e o que não deve. Mas tudo percorre uma trilha em volta dos mesmos objectivos. Ou seja,cria-se um conjunto de regras para garantir que o sujeito social desenvolva a sua acção sem colocar em causa o interesse das somas. E aqui concordo com a abordagem do Langa (o mano mais velho) de questionar a quem emana estes valores! Não serão estes elementos (os homens da vanguarda) que "somam as suas vontades" e geram um conjunto de ligações que os permite "ditar as regras do jogo" ao seu favor? Façam o que eu digo (ou será dito?) e não o que eu faço! Ou se quisermos fiz! O ponto não é que somos todos os sujos, ou que todos os homens de vanguarda o são, mas não será a soma dos seus interesses uma autêntica sujidade? E não estará aqui presente um papel para o organismo social?Limpar a sujidade? E não será que.a moral democrática continua nas mãos dos homens de vanguarda? Ou será que a sujidade das somas agora é menor?
Este texto é apenas uma contribuição ao debate que julgo dever ser mais profundo do que o aqui foi apresentado, é um esboço de um modelo, ou talvez espelho que por estar inclinado para uma certa direcção traz à baila elementos suceptíveis de (auto) correção e melhoria, mas que mesmo assim acredito virem ainda a tempo de apanhar o comboio do ideias paradebate.
Por um chulé menos nauseabundo! Eh eh eh!

Nelson Maximiano
Cape Town, 17/04/2005

Bibliografia:

Milne, Hugh (1986) Bhagwan: The God that Failed. CalibanSmith, Adam (1976) The Wealth of Nations. Random House, Inc. Douglas, Mary (1966) Purity and Danger: An Analysis of the Concepts ofPollution and Taboo; reprinted Penguin, 1970Popper, Karl (1957) The Poverty of Historicism. Routledge; 2nd. ed.,with corrections, 1961.Berry, Christopher J. (1986) Human Nature. Macmillan.Young, Robert M. (1990) 'The Culture of British Psychoanalysis', paperpresented to the Philadelphia Association (and frequently revised andupdated). ______ (1993) 'Introduction: The Profession of Psychotherapy inBritain', Free Assns. (no. 29) 4:79-84. ______ (1994) 'Character and Morality', Paper presented to jointTavistock Clinic and University of London MA in Psychoanalytic Studies(and much revised and updated).