Equilibrio
Estou a chegar ao fim da série de textos que o Dr. Elisio Macamo publicou sob o título comum: O Que a Campanha não Discutiu.
Hoje vai o texto dedicado ao equilibrio étnico-regional:
(9) Estabelecer o equilíbrio étnico-regional
Alguns amigos com quem falei sobre esta série de artigos sugeriram-me que acrescentasse à lista de assuntos a serem considerados pelo novo presidente a questão do equilíbrio regional e étnico na ocupação de cargos. Uma sugestão foi, por exemplo, de diversificar a origem étnica dos ocupantes dos cargos de chefe de Estado, primeiro ministro e presidente do parlamento. A minha reacção instintiva a esta proposta é de rejeição. Perante os argumentos desses amigos, contudo, sinto a necessidade de me debruçar com maior seriedade sobre o assunto. Gostaria, porém, de tentar fazer uma abordagem equilibrada que exponha ambos os lados da questão e proporcionar, dessa maneira, alguns subsídios para uma reflexão mais generalizada nos meios políticos nacionais.
Florentino Dick Kassotche adiantou-se-me e publicou uma interessante reflexão sobre o assunto. Nela ele propõe várias formas de regulamentar a questão baseando-se, largamente, na experiência de outros países em assuntos afins. Embora oportuno e interessante, o seu argumento é algo problemático. Ele defende a consideração do equilíbrio étnico-regional com base na ideia de que dessa maneira se eliminará a exclusão social. Ao longo de todo o artigo, porém, não fica claro o que ele quer dizer com “exclusão social” e, dessa maneira, é difícil de perceber em que medida a distribuição de cargos nos moldes que ele sugere poderia contribuir para o desiderato da inclusão social.
Penso que a ideia central da preocupação por detrás do equilíbrio étnico-regional é de que há necessidade de diversificar as nomeações. Até ao presente os chefes de Estado foram todos provenientes do sul com a agravante de pertencerem a um grupo étnico que, para simplificar as coisas, podemos chamar de “tsonga”. Por outro lado, existem assimetrias na distribuição da riqueza nacional que colocam as regiões centro e norte em desvantagem em relação ao sul. Para os efeitos do argumento, não importa, neste momento, verificar até que ponto isto se comprova empiricamente. O argumento por detrás da necessidade de diversificar as nomeações seria, portanto, de que uma medida dessa natureza pode contribuir para a promoção da unidade nacional através do fomento duma maior identificação com os órgãos nacionais de soberania.
Este argumento, por sua vez, assenta em várias coisas. Primeiro, ele assenta na ideia de que a distribuição de cargos nestes moldes pode resolver os problemas de assimetria regional. Segundo, parte-se do princípio segundo o qual as regiões ou as etnias seriam os principais polos de referência identitária para a maioria dos moçambicanos. Um terceiro aspecto seria, talvez, a ideia de que militantes de partidos, associações e outro tipo de actores institucionais da arena pública representam, fundamentalmente, interesses étnico-regionais.
Críticos de nomeações com base étnico-regional poderiam recear que a competência técnica passasse para segundo plano. Este receio não me parece suficientemente forte, pois a competência técnica pode ser incluída como critério fundamental. Não basta ser sena para ocupar o cargo de ministro de não sei quantos; é preciso ser de comprovada competência técnica. Mais difícil de derrotar seria um outro tipo de interjeição, por exemplo, o receio de que uma política desta natureza crie ela própria os sentimentos étnico-regionais. Ainda não está provado se este problema é geral ou apenas dum grupo relativamente restricto de intelectuais que usam o argumento étnico-regional como trunfo na concorrência por cargos.
Este último receio pode servir de ponto de partida para a exposição da outra posição em relação a este assunto. Na verdade, pode-se dizer que a diversificação das nomeações promove ressentimentos étnicos, pois impõe a etnia e a região como as principais referências. Pode-se apresentar como argumento central a ideia de que a identidade regional e étnica compromete a unidade nacional na medida em que coloca em primeiro plano um discurso virado para a instrumentalização do assunto. Não é que a identidade étnico-regional constitua um problema de princípio. Folclore não é má coisa, com efeito, associações como Nguiana ou Naturais da Zambézia são, pela diversidade que representam, uma condição essencial da moçambicanidade.
Penso ter colocado os dois pontos de vista de forma equilibrada. Continuo a pensar que o assunto é algo artificial, mas precisa de ser discutido. Julgo, porém, que a discussão tem que ter em conta alguns critérios fundamentais. Os ingleses têm um ditado segundo o qual não se deve concertar o que não está estragado. Nesse sentido, falta à este debate sobre as assimetrias regionais e étnicas uma exposição clara do que está estragado. Qual é o problema? Há, como assevera Florentino Dick Kassotche, exclusão social com base étnico-regional em detrimento do norte e centro e de todas as etnias dessas regiões? O que significa essa exclusão social? Que quando se é do norte ou centro, se é macua ou ajaua se é mais propenso a viver na pobreza, a decidir menos politicamente, enfim, a levar uma vida de enteado desta nação? O inverso, já agora, seria verdade? Se se é do sul ou pertencente a uma etnia dessa região é-se mais propenso a viver em menos pobreza, a participar mais nos processos decisórios, enfim, a ser o verdadeiro filho de Moçambique?
O que o novo presidente pode fazer é, talvez, insistir na necessidade de saber em que medida as assimetrias regionais e o facto de os chefes de Estado serem todos oriundos do sul constitui um problema. Até aqui a discussão sobre este assunto tem sido pouco produtiva. Baseia-se simplesmente em palpites informados pela situação existencial de quem gostaria de discutir o assunto. Isso é muito pouco para a formação duma maior coerência nacional.
Hoje vai o texto dedicado ao equilibrio étnico-regional:
(9) Estabelecer o equilíbrio étnico-regional
Alguns amigos com quem falei sobre esta série de artigos sugeriram-me que acrescentasse à lista de assuntos a serem considerados pelo novo presidente a questão do equilíbrio regional e étnico na ocupação de cargos. Uma sugestão foi, por exemplo, de diversificar a origem étnica dos ocupantes dos cargos de chefe de Estado, primeiro ministro e presidente do parlamento. A minha reacção instintiva a esta proposta é de rejeição. Perante os argumentos desses amigos, contudo, sinto a necessidade de me debruçar com maior seriedade sobre o assunto. Gostaria, porém, de tentar fazer uma abordagem equilibrada que exponha ambos os lados da questão e proporcionar, dessa maneira, alguns subsídios para uma reflexão mais generalizada nos meios políticos nacionais.
Florentino Dick Kassotche adiantou-se-me e publicou uma interessante reflexão sobre o assunto. Nela ele propõe várias formas de regulamentar a questão baseando-se, largamente, na experiência de outros países em assuntos afins. Embora oportuno e interessante, o seu argumento é algo problemático. Ele defende a consideração do equilíbrio étnico-regional com base na ideia de que dessa maneira se eliminará a exclusão social. Ao longo de todo o artigo, porém, não fica claro o que ele quer dizer com “exclusão social” e, dessa maneira, é difícil de perceber em que medida a distribuição de cargos nos moldes que ele sugere poderia contribuir para o desiderato da inclusão social.
Penso que a ideia central da preocupação por detrás do equilíbrio étnico-regional é de que há necessidade de diversificar as nomeações. Até ao presente os chefes de Estado foram todos provenientes do sul com a agravante de pertencerem a um grupo étnico que, para simplificar as coisas, podemos chamar de “tsonga”. Por outro lado, existem assimetrias na distribuição da riqueza nacional que colocam as regiões centro e norte em desvantagem em relação ao sul. Para os efeitos do argumento, não importa, neste momento, verificar até que ponto isto se comprova empiricamente. O argumento por detrás da necessidade de diversificar as nomeações seria, portanto, de que uma medida dessa natureza pode contribuir para a promoção da unidade nacional através do fomento duma maior identificação com os órgãos nacionais de soberania.
Este argumento, por sua vez, assenta em várias coisas. Primeiro, ele assenta na ideia de que a distribuição de cargos nestes moldes pode resolver os problemas de assimetria regional. Segundo, parte-se do princípio segundo o qual as regiões ou as etnias seriam os principais polos de referência identitária para a maioria dos moçambicanos. Um terceiro aspecto seria, talvez, a ideia de que militantes de partidos, associações e outro tipo de actores institucionais da arena pública representam, fundamentalmente, interesses étnico-regionais.
Críticos de nomeações com base étnico-regional poderiam recear que a competência técnica passasse para segundo plano. Este receio não me parece suficientemente forte, pois a competência técnica pode ser incluída como critério fundamental. Não basta ser sena para ocupar o cargo de ministro de não sei quantos; é preciso ser de comprovada competência técnica. Mais difícil de derrotar seria um outro tipo de interjeição, por exemplo, o receio de que uma política desta natureza crie ela própria os sentimentos étnico-regionais. Ainda não está provado se este problema é geral ou apenas dum grupo relativamente restricto de intelectuais que usam o argumento étnico-regional como trunfo na concorrência por cargos.
Este último receio pode servir de ponto de partida para a exposição da outra posição em relação a este assunto. Na verdade, pode-se dizer que a diversificação das nomeações promove ressentimentos étnicos, pois impõe a etnia e a região como as principais referências. Pode-se apresentar como argumento central a ideia de que a identidade regional e étnica compromete a unidade nacional na medida em que coloca em primeiro plano um discurso virado para a instrumentalização do assunto. Não é que a identidade étnico-regional constitua um problema de princípio. Folclore não é má coisa, com efeito, associações como Nguiana ou Naturais da Zambézia são, pela diversidade que representam, uma condição essencial da moçambicanidade.
Penso ter colocado os dois pontos de vista de forma equilibrada. Continuo a pensar que o assunto é algo artificial, mas precisa de ser discutido. Julgo, porém, que a discussão tem que ter em conta alguns critérios fundamentais. Os ingleses têm um ditado segundo o qual não se deve concertar o que não está estragado. Nesse sentido, falta à este debate sobre as assimetrias regionais e étnicas uma exposição clara do que está estragado. Qual é o problema? Há, como assevera Florentino Dick Kassotche, exclusão social com base étnico-regional em detrimento do norte e centro e de todas as etnias dessas regiões? O que significa essa exclusão social? Que quando se é do norte ou centro, se é macua ou ajaua se é mais propenso a viver na pobreza, a decidir menos politicamente, enfim, a levar uma vida de enteado desta nação? O inverso, já agora, seria verdade? Se se é do sul ou pertencente a uma etnia dessa região é-se mais propenso a viver em menos pobreza, a participar mais nos processos decisórios, enfim, a ser o verdadeiro filho de Moçambique?
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By Unknown, at 4:36 AM
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