Ideias para Debate

Tuesday, April 25, 2006

Nomes e Alfabetos

Da Fátima Ribeiro recebi esta resposta à Lurdes Torcato:



Nomes Próprios e questões de grafia - resposta a Maria de Lourdes

Logo a mim, Maria de LOUrdes, foste colocar uma questão relativa a nomes! Nem imaginas tu os problemas que tenho com o meu! É que, só meus, tenho 8 vocábulos e 2 “des”, podes crer. Quando, há já muitos anos atrás, se pôs a questão do apelido de casada, disseram-me que só com uma autorização oficial poderia cortar um ou mais dos nomes que já tinha. Preferi ficar como era. Depois, a certa altura, foi algum funcionário que me cortou um dos “des” no BI, e, como só notei muito depois, estava em Moatize e era difícil o processo de correcção, assim foi ficando. A partir daí, fui chamada mil vezes para corrigir impressos que preenchia, aqui ou noutros países, porque não correspondiam ou ao BI, nuns casos, ou ao Passaporte, em outros. Ainda hoje tenho de pensar em como devo escrever o meu nome. Só por causa de um “de”. Finalmente, há menos de um ano fui servir de testemunha num processo de emancipação numa das nossas conservatórias. Entreguei o BI e a funcionária disse-me assim: “Como tem estes nomes? Isto é ilegal! Em Moçambique o máximo que se pode ter é 6 nomes!” Vê lá tu, eu ilegal há quase meio século!

O que eu acho sobre a questão que colocas é que de facto os nomes, mesmo no que respeita à grafia e aos “des” devem manter-se sempre como estão no registo de nascimento ou registos oficiais futuros, pois são uma das nossas principais marcas de identidade e, por razões legais e práticas, para evitar todos os problemas que tu própria colocas. Cada país tem as suas normas sobre a escolha, a grafia, a composição e a alteração dos nomes próprios e apelidos, e não acho mal que assim seja, para que o nome escrito ou dito possa ter uma leitura ou escrita o mais possível uniforme por parte da comunidade em que ocorre, ou para evitar situações de ridículo que podem marcar toda a vida das pessoas, como há muitos casos em Moçambique, ou mesmo para não acontecer, como acontece comigo, o nome não caber nos impressos que se tem de preencher. Acho, no entanto, que a globalização trará consigo uma cada vez maior permuta de nomes e grafias que terão de ser de alguma forma integrados e geridos.

Quanto à escrita com K, W ou Y, penso, como o Mia, que não é pelo facto de estarem presentes que o nome fica mais ou menos africano, e acho ridícula a atitude de quem os utiliza com essa intenção. Mas devo admitir que o seu uso talvez facilite, mesmo em português, a leitura de muitas palavras, tornando-a mais próxima da forma de pronunciar dos falantes nativos. E como as três letras já fazem parte do alfabeto português, porque não utilizá-las nesses casos? Ainda hoje se me pôs a questão ao escrever o nome de um dos nossos rios: Pungué ou Pungwe? Não seria mesmo melhor esta última forma, já que as normas em uso da grafia do português não permitem que se escreva Púngwè ou mesmo Púnguè? (O uso do acento grave é muito, muito restrito: só para situações de crase, como acontece com estas contracções da proposição a com o artigo a e o pronome aquele: à, àquele). No primeiro caso (Pungué), não irão os falantes de português não familiarizados com estas palavras africanas ler tornando mais forte (com mais tonicidade) a sílaba final? Não remeteria a segunda opção de escrita (Pungwe) imediatamente para uma possível diferente leitura, por se reconhecer a palavra como sendo de origem estrangeira?

Felizmente já temos padronizada a escrita das línguas moçambicanas e dicionários de algumas delas, bem como dicionários de moçambicanismos, que nos ajudarão a definir e a consagrar a grafia de palavras do género. Ainda não é fácil, pois mesmo nestas obras de referência encontramos duas e mais grafias da mesma palavra, o que é perfeitamente natural, até que cheguemos a uma convenção.

Finalmente, quanto ao uso das maiúsculas, está bem definido no Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que não o contempla nas preposições. Aos estrangeirados de influência inglesa ou americana de que falas eu perguntaria: Aceitam United States Of América? Cá por mim, só se por alguma razão quiser destacar o “of” ou tirar algum efeito da forma gráfica.

Desculpa esta resposta longa mas meio apressada. Se deixasse para amanhã talvez fosse ficando, ficando... Mas eu gostava de conhecer também outras opiniões.


Um grande abraço


Fátima