Deixa Andar
Aproveitando a janela que parece se abriu aqui vai mais um texto, este do Álvaro Mabunda:
O MALIGNO ESPIRITO DO DEIXA ANDAR
Há algumas semanas, apercebi-me fixada em um dos melhores programas da maior estacão de televisão local, o Ver Moçambique, era entrevistado um administrador distrital a algures de Gaza. Nada de anormal, excepto pela sequência de perguntas do jovem jornalista, feita em um tom digno de interrogatório policial, sobre uma situação qualquer, relacionada com a licença de determinado empresário para exploração de areias... ou algo associado. Fiquei obviamente estupefacta com a situação... mas, cinco minutos depois percebi, o empolgamento grotesco do jornalista. Estava o Governador da Província activamente e em voz alta “de berrar domestico”, digno dos virtuosos que nunca erram (ou erraram...), a dar o mote... criticava, apontava, indignava-se com os moldes com que a dita actividade de exploração de areias estava a decorrer! Reflecti... e percebi, que o jovem jornalista afinal, nada mais tinha feito, se não imitar sua excelência senhor governador, entregando-se assim, a luta contra o espirito do deixa andar!
Quem não estiver distraído, se recorda que o dirigente em causa, fora demitido anos atras, do aparelho de estado, por uso abusivo dos bens de estado... mas como na altura o propalado espirito se achava benigno... tudo bem!
Não passou muito tempo, e assisti a mais barbara situação de atropelo a Ética e aos direitos de qualquer trabalhador acontecer ao vivo, num programa de difusão nacional. Estava o Professor Paulo Ivo Garrido, Ministro da Saúde, a enxovalhar, humilhar em publico determinado funcionário, que com certeza cometera alguma grave falha, outra vez, atónita, não acreditava no triste espectáculo que via... entretanto, as pessoas a minha volta, jubilavam de alegria, pelo excelente exemplo que sua Excelência Dr Ministro dava ao vivo a nação. Indaguei e verifiquei, que afinal, aquela manifestação de alegria popular era um desabafo profundo das gentes, pelo sofrimento passado algumas vezes nas nossos hospitais. Pensei... este homem...agora Ministro, afinal não acaba de cometer ao vivo na televisão apenas um erro...mas sim vários! O primeiro, de certa forma já lançado, refere-se a falta de postura, rectidão e atitude, porque de forma alguma, o Ministro pode ou deve em Democracia, proceder humilhando.... espezinhando em publico, mesmo a aquele funcionário da saúde que de facto teve uma conduta incorrecta. Que exemplo dera a todos funcionários da saúde, sobre procedimentos, respeito entre trabalhadores? entre chefes e subordinados ? entre médicos e enfermeiros? enfermeiros e serventes?
Os únicas formas de governação, baseadas no medo, que existiram ao longo da historia, são as de despotismo e ditadura, digo medo, porque alguém tem de por a mão na cabeça, e perceber que, é impossível mudar o mau comportamento de alguns funcionários da saúde com base no medo e nas famosas visitas e enxovalhamentos públicos...a não ser a curto prazo. Sei por exemplo que por onde o furacão “El Garrido” passou, algo mudou... mas pergunto-me se de forma sustentada? a titulo de exemplo, e isso pude verificar no decurso das minhas actividades, claramente, as bichas para o atendimento em pelo menos duas unidades sanitárias, uma em Chimoio e outra em Pemba, diminuiriam substancialmente, mas pergunto-me sempre, se a velocidade maior do atendimento (diminuição das bichas), corresponde a uma maior entrega do pessoal, ou simplesmente a uma questão numérica...de cumprimento de metas ... e se sua excelência Professor Dr. não se questiona se aquele trabalhador que ameaçou e humilhou, simplesmente e infelizmente, passou a despachar as nossas gentes para cumprir metas ? ou sua excelência somente preocupa - se em apresentar resultados cosméticos?
Após aquele episódio televisivo, fiquei bastante interessado em seguir os passos, desta personagem altamente considerada, cirurgião de renome, confesso que não vi nenhum plano estruturado de combate as enchentes nos hospitais, de motivação do seu pessoal... repito do seu pessoal, e tudo que disse fazer ou prometeu fazer, foi o que os seus antecessores fizeram, desenharam que agora, ele... o génio, pretende mostrar que pouco foi feito.
Em toda minha longa vida, assisti a vários modelos de liderança, mas nunca havia visto um Ministro da Saúde fazer política com a saúde, ainda por cima demagógica, sugerindo a todos soluções milagrosas trazidas pelo seu chicote da ordem... num jogo triste e extremamente perigoso.
Existe uma experiência em alguns países, totalmente diferente dos métodos de “El Garrido”, que são as campanhas de humanização do pessoal de saúde, desde serventes a especialistas, feitas com intuito de resgatar valores do humanismo na saúde, e são muito bem sucedidas por onde soa organizadamente introduzidas, que tal se sua excelência trocasse o desajustado “chicote samoriano” pela sabia “pedagogia de Mandela”?
Um bom líder de equipe, tem de ter a classe e ser admirado pelos seus súbditos, dar o exemplo, para que os jogadores estejam seu lado, para que os médicos, enfermeiros, serventes, radiologistas e farmacêuticos, sintam a sua mensagem e ponham-na em acção e isso é claro cristalino como agua que este ministro, com a filosofia do autoritarismo e do chicote esta a milhas de conseguir, e o que vai mesmo conseguir é mudanças de cosmética, instigar a praticas novas de mau atendimento, talvez mais subtis... talvez mais camufladas... numa espécie de greve silenciosa... e nesta altura, talvez só com os melhores curandeiros da nossa terra se conseguira exorcizar este maligno espirito do deixa andar!
Espelho da terra.
O MALIGNO ESPIRITO DO DEIXA ANDAR
Há algumas semanas, apercebi-me fixada em um dos melhores programas da maior estacão de televisão local, o Ver Moçambique, era entrevistado um administrador distrital a algures de Gaza. Nada de anormal, excepto pela sequência de perguntas do jovem jornalista, feita em um tom digno de interrogatório policial, sobre uma situação qualquer, relacionada com a licença de determinado empresário para exploração de areias... ou algo associado. Fiquei obviamente estupefacta com a situação... mas, cinco minutos depois percebi, o empolgamento grotesco do jornalista. Estava o Governador da Província activamente e em voz alta “de berrar domestico”, digno dos virtuosos que nunca erram (ou erraram...), a dar o mote... criticava, apontava, indignava-se com os moldes com que a dita actividade de exploração de areias estava a decorrer! Reflecti... e percebi, que o jovem jornalista afinal, nada mais tinha feito, se não imitar sua excelência senhor governador, entregando-se assim, a luta contra o espirito do deixa andar!
Quem não estiver distraído, se recorda que o dirigente em causa, fora demitido anos atras, do aparelho de estado, por uso abusivo dos bens de estado... mas como na altura o propalado espirito se achava benigno... tudo bem!
Não passou muito tempo, e assisti a mais barbara situação de atropelo a Ética e aos direitos de qualquer trabalhador acontecer ao vivo, num programa de difusão nacional. Estava o Professor Paulo Ivo Garrido, Ministro da Saúde, a enxovalhar, humilhar em publico determinado funcionário, que com certeza cometera alguma grave falha, outra vez, atónita, não acreditava no triste espectáculo que via... entretanto, as pessoas a minha volta, jubilavam de alegria, pelo excelente exemplo que sua Excelência Dr Ministro dava ao vivo a nação. Indaguei e verifiquei, que afinal, aquela manifestação de alegria popular era um desabafo profundo das gentes, pelo sofrimento passado algumas vezes nas nossos hospitais. Pensei... este homem...agora Ministro, afinal não acaba de cometer ao vivo na televisão apenas um erro...mas sim vários! O primeiro, de certa forma já lançado, refere-se a falta de postura, rectidão e atitude, porque de forma alguma, o Ministro pode ou deve em Democracia, proceder humilhando.... espezinhando em publico, mesmo a aquele funcionário da saúde que de facto teve uma conduta incorrecta. Que exemplo dera a todos funcionários da saúde, sobre procedimentos, respeito entre trabalhadores? entre chefes e subordinados ? entre médicos e enfermeiros? enfermeiros e serventes?
Os únicas formas de governação, baseadas no medo, que existiram ao longo da historia, são as de despotismo e ditadura, digo medo, porque alguém tem de por a mão na cabeça, e perceber que, é impossível mudar o mau comportamento de alguns funcionários da saúde com base no medo e nas famosas visitas e enxovalhamentos públicos...a não ser a curto prazo. Sei por exemplo que por onde o furacão “El Garrido” passou, algo mudou... mas pergunto-me se de forma sustentada? a titulo de exemplo, e isso pude verificar no decurso das minhas actividades, claramente, as bichas para o atendimento em pelo menos duas unidades sanitárias, uma em Chimoio e outra em Pemba, diminuiriam substancialmente, mas pergunto-me sempre, se a velocidade maior do atendimento (diminuição das bichas), corresponde a uma maior entrega do pessoal, ou simplesmente a uma questão numérica...de cumprimento de metas ... e se sua excelência Professor Dr. não se questiona se aquele trabalhador que ameaçou e humilhou, simplesmente e infelizmente, passou a despachar as nossas gentes para cumprir metas ? ou sua excelência somente preocupa - se em apresentar resultados cosméticos?
Após aquele episódio televisivo, fiquei bastante interessado em seguir os passos, desta personagem altamente considerada, cirurgião de renome, confesso que não vi nenhum plano estruturado de combate as enchentes nos hospitais, de motivação do seu pessoal... repito do seu pessoal, e tudo que disse fazer ou prometeu fazer, foi o que os seus antecessores fizeram, desenharam que agora, ele... o génio, pretende mostrar que pouco foi feito.
Em toda minha longa vida, assisti a vários modelos de liderança, mas nunca havia visto um Ministro da Saúde fazer política com a saúde, ainda por cima demagógica, sugerindo a todos soluções milagrosas trazidas pelo seu chicote da ordem... num jogo triste e extremamente perigoso.
Existe uma experiência em alguns países, totalmente diferente dos métodos de “El Garrido”, que são as campanhas de humanização do pessoal de saúde, desde serventes a especialistas, feitas com intuito de resgatar valores do humanismo na saúde, e são muito bem sucedidas por onde soa organizadamente introduzidas, que tal se sua excelência trocasse o desajustado “chicote samoriano” pela sabia “pedagogia de Mandela”?
Um bom líder de equipe, tem de ter a classe e ser admirado pelos seus súbditos, dar o exemplo, para que os jogadores estejam seu lado, para que os médicos, enfermeiros, serventes, radiologistas e farmacêuticos, sintam a sua mensagem e ponham-na em acção e isso é claro cristalino como agua que este ministro, com a filosofia do autoritarismo e do chicote esta a milhas de conseguir, e o que vai mesmo conseguir é mudanças de cosmética, instigar a praticas novas de mau atendimento, talvez mais subtis... talvez mais camufladas... numa espécie de greve silenciosa... e nesta altura, talvez só com os melhores curandeiros da nossa terra se conseguira exorcizar este maligno espirito do deixa andar!
Espelho da terra.
5 Comments:
Caro Machado,
Acabo de ler o texto de Álvaro Mabunda e o comentário assinado por M. Tivane. Fiquei algo estupefacto com o conteúdo, sobretudo com o conteúdo do comentário de M. Tivane. Moçambique precisa de intelectuais críticos e dum debate honesto e corajoso. Esse debate não vai ser possível enquanto só se reconhecer como válida, honesta e corajosa a intervenção daqueles que criticam o poder. O debate é a troca de ideias e os que nele participam têm que confrontar as ideias, não o que pensam serem as intenções dos participantes. O que enfraquece o argumento de M. Tivane, salvo melhor informação, é que ele aparentemente ainda está vivo e, provavelmente, não está na desgraça. Das duas uma: ou não é corajoso como espera que os outros sejam, ou então o clima de debate não é assim tão mau. De qualquer maneira, acusar os participantes deste "blogg" de cobardia por apenas discutirem o "sexo dos anjos" parece-me muito injusto. E arrogante: Será que só aquilo que ele vê como problema é problema?
Teria maior compreensão para a sua preocupação se o texto que ele tanto elogia fosse de facto uma grande contribuição para a melhoria deste país. Mas não é. É apenas a diabolização dum indivíduo, cujo comportamento, embora lamentável, não me parece explicar os nossos problemas. Ao invés de apelar para a mudança de comportamento do Ministro devia procurar saber porque esse tipo de comportamento é possível, como se pode garantir a integridade e dignidade individuais dos funcionários públicos e que mecanismos jurídicos, sociais e políticos existem para tornar isso tudo possível.
Infelizmente, o nosso debate sempre emperra porque as pessoas que se consideram críticas do poder semprem partem da premissa dum governo todo poderoso, omnisciente, presciente e ubíquo e acabam perdendo fé no potencial de debate de ideias para melhorar o país. Resvalam para teorias de conspiração.
Gostaria de terminar com um apelo a todos os jovens que têm participado com tanta imaginação e frescura neste "blogg" para que se não deixem desanimar por este tipo de invectivas.
Um abraço
By Elísio Macamo, at 11:59 PM
Boa Observação Elísio Macamo. Ela não se esgota ao caso em questão, mas paira um pouco por todos os temas em discussão. É um pano de fundo que beira um pouco ao niilismo.
By Mangue, at 9:05 AM
Se o texto em questão é o exemplo do "inconformismo" celebrado pelo "ameliagoncalves" e de "reflexão profunda" aplaudida por "srsnbernardo" está visto porque o nosso governo não pode ser melhor do que é agora. os que a ele se opõem e o criticam precisam de ser muito melhores do que isto. E precisam de ter a coragem de mostrar a cara.
Há vários meses que o jornal "Domingo" criticou o estilo do Ministro da Saúde. Que eu saiba, nenhum funcionário desse jornal sofreu represálias por causa disso. Se a crítica quer mesmo ser "inconformada" e representar uma "reflexão profunda" então que seja mesmo verdadeiramente "inconformada" e "profunda". Na impossibilidade de o ser, que seja pelo menos original.
By Elísio Macamo, at 11:37 PM
Volto a insistir sobre o assunto porque é evidente que não estamos a falar das mesmas coisas. Se o "ameliagoncalves" me inclui na categoria de "personalidades" devo lhe dizer que, da minha parte, não houve nenhum ataque "feroz" ao que Álvaro Mabunda escreveu. Comentei essencialmente as observações feitas por M. Tivane a propósito da qualidade das intervenções feitas neste "blogg" por outras pessoas. Discordei da ideia de que a crítica só é válida quando é contra o poder. Procurei mostrar que a sua posição compromete o próprio debate. Álvaro Mabunda entrou nas minhas considerações apenas como exemplo do que uma boa crítica - ainda que contra o poder - não pode ser, justamente por lhe faltar "inconformismo", "profundidade analítica" e, já agora, "frontalidade". Se o "ameliagoncalves" acha que o texto de A. Mabunda tem qualidade, muito bem, só que da minha parte isso revela quanto ainda falta aos que se julgam críticos do governo para de facto constituirem algo digno de nota em termos de crítica. Sobre o anonimato o "ameliagoncalves" tem razão em relação ao valor da troca de ideias e não de bilhetes de identidade. O que me incomoda é que as pessoas que defendem tanto a "frontalidade" não tenham coragem de dar na cara. Esse é que é o paradoxo. Que fé devo ter em alguém que insiste na frontalidade, mas não diz quem é?
By Elísio Macamo, at 11:31 PM
Ainda bem que começa a ver as coisas como as vejo. Mais uma vez: Insurgi-me contra a ideia de que a crítica só é válida quando é contra o poder. Isso é o que pude depreender do comentário feito por M. Tivane e também da sua própria insistência na ideia de que quem não vê as coisas como você as vê está feito com o poder, é cego, quer manter hipnose, etc. É claro que criticar não significa ser opositor, embora não exclua essa possibilidade. Só a indignação não é suficiente para se ter razão. É preciso muito mais, ponderação, profundidade na análise e, sobretudo, a frieza de que fala e que tanto faz falta nos comentários que tem vindo a fazer. Só isso vai tornar o debate intelectual útil. Só isso nos vai precaver de usar a palavra "filosofia" como um insulto dirigido ao que outras pessoas dizem, e que não percebemos, ou que são diferentes do que nós próprios achamos. É preciso abertura de espírito para ver o efeito emancipatório do debate, independentemente do que motiva as pessoas a intervirem. É contra tudo isso que me insurgi e vou continuar a protestar. Cada qual tem o direito de se debruçar sobre o que lhe interessa, da maneira que mais conveniente achar, sem, contudo, querer impôr sobre os outros a sua maneira de ver as coisas sob pena de acusação de estar em conluio com o poder. Uma parte do atraso em que o nosso país se encontra explica-se em grande parte pelo tipo de atitude que defende nos seus comentários: nos anos a seguir à independência houve muita insistência numa "verdade" sancionada ideologicamente. Se há alguma licção que devíamos ter aprendido disso é justamente a ideia de que temos que ter a coragem de relativizar os nossos pontos de vista. Nenhum de nós é detentor da verdade nem dos assuntos que são verdadeiramente importantes para este país. Nenhum. Mas as regras sobre como trocar opiniões deviam ser consensuais.
By Elísio Macamo, at 8:55 AM
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